A obsessão de algumas pessoas por Fátima continua a crescer. Fátima transformou-se num credo de enorme sucesso, num fetiche, que para a maioria da espécie humana é a expressão mais evoluída de religião, sucedânea do antropomorfismo das crenças primárias, que o cristianismo (e outras religiões ditas axiais mas que seria mais correcto chamar de abraâmicas) assimilou e integrou no seu culto, talvez mais humano formalmente, mas de evidente primitivismo na essência.
Respeito e despertam-me sentimentos de compaixão aquelas pessoas que se arrastam pela passadeira de mármore polido que desce da colina, onde antes da Igreja da Santíssima Trindade, estava a Cruz Alta até à capelinha, dita das Aparições, e a circundam em condições deploráveis de repugnante humilhação.
Este culto do sofrimento, do sacrifício e da humilhação é, em meu pensamento, a óbvia negação do cristianismo. Bem pode o Papa clamar que Deus é Amor, Deus caritas est, que esta gente não entende. Parece que os discípulos do Cristo também não entenderam e inventaram uma religião que cada vez se foi afastando mais da essência do pensamento do Crucificado.
E isto leva-me a um outro pensamento: “O que está a fazer à entrada lateral direita do Santuário, delicadamente protegido por uma vitrina que parece uma capela, uma fatia do Muro de Berlim?” Eu sei que puseram na boca dos pastorinhos a «Nossa Senhora» a prometer a conversão da Rússia… mas o muro ainda nem estava feito. Outros afirmam que a queda do muro simboliza a falência do comunismo. Esquecem contudo que o comunismo foi uma resposta séria e coerente à falta de eficácia da Doutrina Social da Igreja, ainda hoje sonegada, e menos ainda praticada, pelos mais fiéis seguidores de Roma. Desconhecem também que a RERUM NOVARUM, primeira encíclica social da Igreja, foi contemporânea de Marx e era uma tentativa de revolta dos pobres contra a impiedade dos ricos. O Comunismo tentou impor à bruta o que a Igreja não era nem é capaz de fazer com paninhos quentes.
Daí eu pensar que este monumento ao Muro de Berlim, em Fátima, é uma intolerável incursão do reino Deus no reino de César.
Do outro lado do Santuário está a pira da cera. Os vendilhões dos templos são indestrutíveis!