Quase anoitece, debruçado sobre a baía em concha, chá verde e torrada sobre a mesa em que escrevo, a 4 de Outubro, Sábado.
Esta tarde visitámos o Mosteiro de Alcobaça. Só me lembro de o ter visitado em garoto, a caminho ou no regresso de Fátima a Lisboa. Sabia que estavam lá os túmulos de D. Pedro I e de D. Inês de Castro, lembrava-me de uma enorme cozinha, onde a minha avó Emília me ia explicando que era atravessada pelo Rio Baça e misturavam-se nessas memórias de brumas, outras memórias de fotografias de livros de História e de Arte. Mas hoje vi-o conscientemente, não completamente que é fisicamente impossível, mas com a minúcia do que pode ver-se em quatro horas de visita.
Arcos e arcos, corredores e corredores, salas e salas, cozinha, adega, refeitório, claustros, dormitórios, sala do capítulo, igreja, capelas… colunas, cada uma mais espantosa que as outras, de traços, volutas, ramos, folhas, gavinhas, animais, bolotas… os olhos aquietavam-se embriagados, tais os néctares de beleza que nos eram servidos.
Depois apreciámos o trabalho. O bruto e o especializado, o grosseiro e o finamente lavrado… tantos! Há sangue de homens, de alguns certamente, naquelas pedras, mas o seu nome passou, conhecido por meia dúzia de companheiros contemporâneos, ignorado de mestres e artistas e mais ainda dos mecenas que propiciaram a obra. Mosteiro de cistercienses, um ramo notável da família dos beneditinos que tanta importância teve na génese da nação portuguesa. Os domínios desta Ordem estendiam-se das Serras de Aires e Candeeiros ao Atlântico. E se o rei abria assim mão de tal parcela do território conquistado não era por simples questão de Fé, havia mais, um interesse muito material em valorizar, povoar, arrotear, cultivar e criar riqueza. Não para o povo que esse coitado, contentava-se com as migalhas, mas para o clero, essencialmente formado por nobres sem acesso à herança da família.
Continuarei, noutra altura, com os túmulos dos Reis D. Pedro e D. Inês.