28 de Setembro de 2006
Ontem no “Esquina”, olhei à minha volta com atenção coisa que já há muito tempo não fazia. Tenho andado neura, desinteressado bastante do que me rodeia. Tento olhar e parece-me que só me vejo a mim.
Reparei que as mulheres da cidade andam mais tristes ou sou eu que as estou a ver com os olhos da minha tristeza.
Os seus semblantes estão como que toldados, a beleza que em muitas existe está baça (como que vista através de uma névoa), os sorrisos forçados, artificiais e soando a falso, o riso ausente… Porque será?

Também ontem acabei de ler o livro de memórias de Maria Filomena Mónica – “Bilhete de Identidade”.
Senti angústia nas frases daquela mulher! O livro é quase inútil e incompreensível se não nos concentrarmos na situação extrema em que se encontra a escritora – Alzheimer da mãe – que a obriga a revirar-se toda interiormente como se usa fazer às tripas dos enchidos para as lavar e preparar para receberem o recheio.

Sou mais velho que ela meia dúzia de anos mas grande parte dos espaços a que se refere, são espaços coincidentes com alguns dos meus, em Lisboa, na mesma época – “Vavá”; “Campo Grande”; “Biblioteca Nacional” e outros locais da capital nos anos sessenta.
Alguns nomes das personagens citadas ouvi-os nos anos quarenta e cinquenta nos Médicos da Caixa, na Escola Primária e no Liceu: O médico Salazar de Sousa, que a tratou da disenteria em Cascais, foi meu médico de família na Caixa de Previdência dos Empregados e Operários da Companhia das Águas de Lisboa; e apelidos de Guardiola, Correia Guedes, Pinto Coelho, Cunha Teles e Galvão Teles, eram apelidos que usavam alguns colegas da Escola Primaria do Campo Grande, os dois primeiros se a memória não me falha, e os outros no Liceu Camões.
Ela era a menina bem burguesa e eles da mesma maneira, eu era o menino rude e proletário. Quando entrei no primeiro ciclo do liceu em Outubro de 1948 que me lembre, em todo o primeiro ano, havia só quatro filhos de proletários: eu e o Eduardo, filhos de motoristas - o meu pai da CAL o dele da CARRIS, o filho de um polícia, cujo nome não recordo e o filho de um solado da Guarda Republicana com quem andava muitas vezes à porrada e cujo nome esqueci.

Hoje comecei a ler «A Ilusão Neoliberal». Acho que vou gostar muito, pois está em desacordo com quase tudo o que os governos hodiernos na Europa estão a fazer.
publicado por MaiaCarvalho às 20:03

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